La Ley del Retiro
O som bate em três tempos...
Ela me explicava sobre todos aqueles pensamentos.
Eram metáforas, gestos, expressões, olhares, o jeito que os lábios se mexiam... uma explosão de sensações, mas todos com uma lentidão rítmica, profunda, frustrada.
Era uma valsa.
O cachorro dormia profundamente sobre o carpete púrpura. A chuva, nem forte nem fraca, parecia acompanhar suas falas, tornando a atmosfera ébria.
Maturidade sufocante, e mesmo assim etérea. Parecia que ela não estava ali, que fazia parte do ambiente. Podia vê-la por todos os lugares. Sua voz não parecia sair dos labios, e sim das paredes, das janelas, do abajur, da cortina, das plantas, em coro. Estavam todos dando seu parecer, seu depoimento, todos cúmplices.
Mas eu não conseguia entendê-los, os pensamentos. Me perdia em sua confusão. Agora, como ela, estava sem os pés no chão. Como ela costuma falar... "caindo pelas pernas".
Eu precisava de algo, mas não sabia. Ou melhor, podia até saber que precisava, mas não sabia o quê.
Senti meu corpo todo trincar, estilhaçar, esfarelar e os sedimentos da minha confusão fazendo parte agora do ar daquela sala. Dela.
Então, ela parou de falar e olhou para a minha poeira flutuante... como se já esperasse por isso.
Até agora, era apenas mais um.
Logo depois, alguém se sentou onde eu estava anteriormente. E ela começou a falar novamente de seus pensamentos, no mesmo ritmo. Falava baixo, mas logo senti as vibrações. Agora eu fazia parte da sala, e vibrava juntos dos outros objetos.
Percebi então que estava perdido naquela simbiose irreversível.
Agora conseguia entendê-la...
disparates IV
Há 9 anos